Depois daquele sábado incomum Joshua passou a ser parte da
minha rotina. Quando nos despedimos em frente ao cinema ele me pediu que
gravasse meu número em seu celular enquanto ele fazia o mesmo. Mal tínhamos nos
separados quando meu celular vibrou com uma mensagem dele. “Espero que essa não
seja a última vez que eu te vejo”, dizia. Sem entender muito bem o motivo,
sorri e lhe respondi: “Não acredito que vá ser”. E a partir daquele momento
trocamos mensagens todos os dias, praticamente o dia inteiro. Logo que eu abria
meus olhos de manhã cedo, agarrava o aparelho que já me alertava de uma de suas
mensagens.
- Com quem você tanto fala Allison? – Charlotte me
perguntava enquanto tentava limpar o molho de churrasco do canto da boca usando
as costas de uma das mãos.
- Ah... O cara do cinema, lembra que te disse que ele me pediu que passasse meu número pra
ele?
- O gatinho? – concordei com a cabeça enquanto roubava uma
das batatas fritas que ela deixara sobre o prato – E você acha que rola alguma
coisa?
- Sei lá Charlie. Eu não sei se eu quero. – mal tinha
terminado de falar e ela já me olhava com aquela cara de “qual é o seu
problema?” e me adiantei na resposta- Eu não quero me apaixonar entende? Eu já
tenho problemas demais pra minha pouca idade, Josh não pode ser mais um.
- E desde quando se apaixonar é um problema Ally? E mais:
Você pode muito bem dar uns pegas no cara e deixar por isso mesmo, você não é
obrigada a se envolver. – Charlotte é a rainha dos concelhos mas sinceramente,
era difícil de me concentrar no assunto enquanto ela comia um hambúrguer cheio
de molho praticamente deitada no sofá.
- Eu sei, eu sei mas e se eu não conseguir não me envolver
com ele? Senta direito Charlie pelo amor de Deus. – bufando ela se arrumou ao
meu lado, tentado equilibrar o prato de batatas fritas e o sanduíche na mesma
mão. Só de pensar na nojeira que aquele sofá ficaria se ela deixasse o molho
cair eu sinto um calafrio – Fora também que tem menos de uma semana que a gente
se conhece, eu não posso avançar assim.
- Você que sabe Al, só acho que seria um enorme desperdício
não dar uns beijos naquela gracinha.
Então nós dois continuamos nos falando todo santo dia. Me
ligava sempre que podia e passávamos horas conversando sobre assuntos
aleatórios até que um dos dois dormisse ou estivesse cansado demais pra
continuar. Os cafés da manhã aos sábados se tornaram mais um costume
nosso. Sempre no mesmo horário e na
mesma mesa em que nos sentamos naquele primeiro dia. Eu tomando meu mocca e ele
o seu café. Puro e sem açúcar. Em uma dessas manhãs em que dividíamos aquela
“nossa” mesa, vi Josh sorrindo sozinho enquanto remexia um resto de café de sua
xícara.
- O que foi? – perguntei sorrindo porque aquele sorriso bobo
que estava no rosto dele era mais contagioso do que a maioria dos sorrisos.
- Só pensando. – me respondeu com aqueles olhos castanhos
indo de encontro aos meus e me fazendo perder um pouco de ar – Tava pensando em
como eu queria ter te conhecido antes.
Juro que eu tentei não corar, mas como isso seria possível
com um cara daqueles me falando com aquele sorriso divino e aqueles olhos
hipnotizantes que queria ter me conhecido antes? Eu achava que tinha ficado
levemente corada mas pelo modo como ele agiu em seguida acho que eu parecia
mais um pimentão.
- Desculpa Ally, eu não queria te deixar sem graça. Mas é
mais pura verdade – completou com a voz em tom de riso antes de tomar o que
sobrava de seu café.
- Tá tudo bem Josh, eu só... – coloquei minha mão direita no
meu rosto (quente) – não estava esperando por isso.
Ficamos em silêncio por alguns segundos que me pareceram
horas. Tudo o que eu queria era poder observa-lo, ouvir sua voz rouca,
aproveitar a combinação maravilhosa de sua pele clara com a camiseta preta que
vestia, o jeito como seu peito subia e descia ritmado enquanto respirava. Era
tudo o que eu queria. E tudo o que eu não queria. Joshua estava se tornando uma
parte maior da minha vida a cada dia. Quando estávamos longe tudo o que
conseguia fazer era recordar nossas conversas e quando juntos eu rezava para
que minha memória conseguisse armazenar cada segundo que se passava.
- Então – Josh finalmente quebrou o silêncio, me salvando
dos meus pensamentos, e sua voz estava anormalmente tímida – eu me esqueci de
te falar, mas sábado que vem é meu aniversário então sexta-feira vai ter uma
reuniãozinha lá no meu apartamento, só pra alguns amigos. Seria muito legal se
você pudesse ir.
Tudo nele era tão adorável. Principalmente o modo como ele
agia quando estava inseguro. Coisa que eu achava que era impossível, ao menos
para aquele Joshua que eu havia conhecido há um mês e pouco atrás, sempre tão confiante
e natural.
- Seria um prazer. – assim que confirmei minha presença seu
rosto se iluminou com aquele sorriso que eu tanto gosto. Aquele mesmo que eu
disse que ainda vai estar gravado na minha memória daqui a vinte anos.
Os dias até a noite da festa de Josh pareciam durar bem mais
do que deveriam. As horas se esticavam infinitamente mesmo quando ele me ligava
de noite. “E o que você vai me dar de presente, hein?” ele me perguntou com uma
voz preguiçosa enquanto eu guardava o que havia comprado dentro de uma gaveta
na escrivaninha ao lado da minha cama.
- É um segredo Joshua. Amanhã você vai saber.
- Eu tava só brincando Ally, você não precisava ter me
comprado nada. Só sua presença na festa seria mais do que ótimo. – o misto de
sono e riso na voz dele deixava tudo o que ele dizia mil vezes mais fofo. Então
comecei a imaginar ele, deitado em sua cama com os olhos cansados mas ainda
assim falando comigo, enquanto eu igualmente cansada me deitava
preguiçosamente. Todas as noites enquanto nós nos falávamos, em algum momento
eu fechava meus olhos e nos imaginava em uma outra dimensão. Um lugar onde
existisse só nós dois. Um lugar em que sua voz rouca fosse a única coisa a se
ouvir.
- Eu tô tão feliz de saber que não vou ter que esperar até
sábado pra te ver, sabia? – mais uma vez ele conseguia me deixar sem fôlego –
Queria ter mais tempo.
- Mais tempo pra reclamar das minhas escolhas relacionadas a
café? – brinquei, fazendo-o rir na nossa dimensão particular – São só mais
algumas horas.
- Eu ainda vou ter que acordar. Sair pro trabalho. Voltar do
trabalho. Arrumar as coisas da festa... Não vai ser tão rápido assim não. E eu
ainda vou ter que passar todo esse tempo me perguntando: “O que será que a Ally
me comprou?”. Vai ser insuportável, já posso sentir.
Quando contei para Charlie na noite seguinte enquanto me
arrumava, onde era o prédio de Josh, ela me deu o seu melhor olhar safado.
“Quer dizer então que além de gato o cara ainda tem uma grana boa é? Se você
não quiser nada com ele mesmo, avisa que você tem uma amiga linda, loira e
solteira tá?” Depois disso ela me fez trocar minha calça jeans e a camisa que
eu vestia por um dos vestidos dela.
- Mas Charlie, ele disse que é só uma reuniãozinha com
alguns amigos, não tem motivo pra...
- Não tem motivo? Allison, você viu o mesmo endereço que eu?
Ele mora na área nobre mais nobre dessa cidade toda e eu me recuso a deixar
você sair por essa porta sem um vestido e uma maquiagem decente.
Honestamente agradeço por isso até hoje porque no momento
que eu saltei do taxi vi que me sentiria deslocada vestindo jeans. Assim que
cheguei ao interfone, mais uma surpresa. Joshua morava no vigésimo quinto
andar, agora adivinhe quantos andares existiam? Isso mesmo, vinte e cinco.
Apertei o botão de seu andar (sim, um apartamento por andar) com as mãos
suadas.
- Sim? – reconheci aquela voz no mesmo segundo.
- Hey Josh, é a Ally. – o portão fez um barulho estranho
antes que o dono daquela voz voltasse a falar, me mandando subir. O saguão daquele prédio era tão grande que
acredito que talvez meu apartamento coubesse quase inteiro lá dentro. Quando as
portas do elevador se abriram no vigésimo quinto andar ele já me esperava lá,
com um sorriso iluminando o rosto. Devo dizer que ele me parecia mais bonito a
cada vez que o encontrava. Vestia uma camisa social preta com as mangas
levantadas até a altura de seus cotovelos, jeans e um par de all stars. E
claro, os cabelos bagunçados como de costume.
- Uau... – ele disse enquanto andava até ele, seus olhos
acompanhando cada movimento meu – Você está... Uau.
Muito obrigada pelo vestido vermelho Charlie, te devo uma.
- E você também está “uau” senhor quase aniversariante. –
ele sempre estava “uau”, grande novidade – E por falar nisso... – e entreguei a
ele o presente que havia comprado – Espero que você goste.
Com os olhos brilhando tanto quanto seu sorriso, Joshua
rasgou a embalagem para encontrar um exemplar de “O Iluminado” de Stephen King,
assim como um dvd do primeiro filme que vimos juntos.
- Ah Ally! Isso é muito legal! Muito obrigado mesmo
princesa. – minha cabeça girava como nunca antes. Não sei se porque ele acabara
de me chamar de princesa, ou porque ele estava me abraçando. Por alguns
segundos eu senti que era naquele lugar que eu pertencia, entre os braços de
Joshua, sentindo seu perfume e ouvindo seu coração. E isso só podia significar
uma coisa: Eu estava me apaixonando. Coisa que eu havia jurado que não
aconteceria.
Bem, se aquelas pessoas na festa eram só os amigos mais
próximos dele eu posso te dizer que Josh era bastante popular. O terraço – sim a festa foi no terraço – deveria
ter no mínimo umas trinta pessoas. O lugar estava incrivelmente bonito de um
jeito simples, exatamente como o dono da festa. Mesas estavam dispostas com
petiscos e garrafas de bebidas e todo o lugar tinha luzinhas como aquelas de
natal, deixando tudo com um ar romântico, mesmo com um cara (muito) bêbado
cantando em uma máquina de karaokê.
O cantor bêbado puxou Josh que conversava comigo pelo braço
até o karaokê e o entregou outro microfone, falando um “canta essa comigo mano”
na língua dos bêbados. A canção da vez era “Can’t help falling in love” do
Elvis Presley, conhecida também como uma das músicas românticas mais lindas de
todos os tempos segundo eu mesma. Os dois dividiram o vocal da música até que o
cara desmaiasse no chão, deixando o dono da festa sozinho no meio da canção.
Josh tentou me fazer ir até lá e eu argumentei que aquele não era um dueto, o
que funcionou bastante bem até a parte em que ele começou a cantar a música para mim. Mesmo que eu sentisse os olhos
de todos que estavam lá em cima de mim, eu não conseguia me importar. Novamente
era como se nós dois estivéssemos naquela nossa dimensão particular, a
diferença é que agora ele estava na minha frente, não do outro lado da linha.
Conheci alguns de seus amigos, alguns caras com quem ele
estudou Administração na faculdade, alguns caras da empresa, as namoradas de
alguns deles. Todos muito simpáticos, sempre perguntando sobre mim e como eu
havia conhecido Joshua.
- Ainda bem que aquela reunião foi cancelada né? – a
namorada de um colega de trabalho dele disse pra mim enquanto conversávamos
próximas à mesa das bebidas. Meus olhos vagaram pelo terraço até encontra-lo
rindo com um amigo, que não tardou a sorrir pra mim.
- É. – disse quase que em um suspiro – Acho que sou muito
sortuda mesmo.
Já era madrugada e quase todos os convidados haviam ido
embora, só alguns sete se empenhavam em um jogo de pôquer enquanto alguma banda
indie cantava pelos alto falantes. Enquanto eu observava a partida e ria dos
caras meio bêbados tentando fazer caras de pôquer sem muito êxito, Joshua
brotou atrás de mim, depois de ter acompanhado um casal de amigos até o
elevador.
- Gostou da festa? – sussurrou no meu ouvido me pegando de
surpresa.
- Está tudo incrível Josh, o bolo então, nem se fala. –
respondi antes de ter o maior arrepio da minha vida. Como já era bastante tarde
o ar já estava frio, e é lógico que eu não havia levado nem mesmo um cardigã.
- Tá com frio princesa? – ah não, essa história de me chamar
de princesa não dá certo com o meu coração – Desce comigo lá pro apartamento
que eu te empresto uma blusa e aproveito pra pegar um bolo pra mim.
- Tá tudo bem, não precisa se preocupar com nada.
- Por favor Ally, eu não quero te ver doente vai? – e foi me
puxando em direção ao apartamento. Chegando lá ele me pediu para esperar na
cozinha enquanto buscava algo que eu pudesse vestir, então me sentei em um dos
bancos de acrílico vermelho dispostos na lateral de uma gigantesca bancada de
pedra para esperar. Poucos minutos depois ele voltou com um cardigã cinza em
uma das mãos grandes.
- Não vai combinar com seu vestido mas pelo menos você não
vai passar frio. – disse enquanto me vestia com o casaco que conseguia misturar
o seu perfume com o aroma de amaciante. De repente me lembrei do motivo daquela
festa e do fato de que já se passava (a bastante tempo) da meia noite e saltei
do banco em que estava sentada.
- Josh eu estava te esquecendo de dar parabéns! Vinte e dois
anos, eu não posso deixar passar em branco – enquanto ficava na ponta dos meus
pés para abraça-lo, Josh já abriu os braços para me abrigar em seu peito –
Parabéns Josh, que esse seja só o primeiro aniversário que passo do seu lado. –
seu rosto estava enfiado no meu pescoço enquanto suas mãos faziam carinho nas
minhas costas, e juro que consegui sentir seus lábios se moldando naquele
sorriso perfeito contra a minha pele.
- Muito obrigado pelo presente, Ally. – falou depois de me
soltar, me olhando com aqueles olhos brilhantes de sempre.
- Imagina Josh, não foi nada. Como você tinha gostado tanto
do filme aquele dia, achei que você iria gostar mesmo.
- Não estou falando do que você me comprou. – e tirava uma
mecha de cabelo do meu rosto enquanto continuava falando – Obrigado por ter me
deixado sentar à sua mesa aquele dia. Obrigado por ter me dado a chance de te
conhecer. Você foi o melhor presente que eu poderia ganhar.
Antes que eu pudesse perceber, o corpo de Joshua estava
muito mais próximo do meu do que eu me lembrava, assim como seu braço não
estava me puxando em direção ao seu quadril. Quando dei por mim, estávamos nos
beijando e diferentemente do que eu achava que faria, não o parei. Não tinha
forças para isso. Não queria que ele parasse. Pro inferno com essa história de
não querer me envolver. Depois de um longo silêncio, em que minhas mãos
resolveram bagunçar um pouco mais os cabelos escuros de Josh, ele rompeu o
beijo ainda me segurando prensada contra seu corpo. Afastei meu rosto do dele,
a tempo de ver uma pontada de medo naqueles traços que eu já conhecia bem.
- Eu não quero de machucar. – quase como um sussurro ele
disse, encostando sua testa à minha.
Novamente o Josh inseguro estava lá na minha frente. Seus
braços cercando minha cintura como se tivesse medo de que saísse correndo. Os
olhos fechados. A respiração um pouco ofegante.
- Se alguém nesse mundo for me machucar – disse passando uma
das mãos por seus cabelos, ainda com nossas testas coladas – eu prefiro que
seja você.
Por Mariana J.
n/a: Feliz dia dos namorados! ♡ ♡ ♡
n/a 2: Esse texto é na verdade a continuação de um outro já postado aqui, o "One". Se você chegou agora e quer entender melhor a história desses dois e só clicar aqui.
n/a 2: Esse texto é na verdade a continuação de um outro já postado aqui, o "One". Se você chegou agora e quer entender melhor a história desses dois e só clicar aqui.
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