terça-feira, 17 de dezembro de 2013

I’ve just seen a face.

Era Domingo. Por volta das três da tarde. Eu estava sentada em uma mesa qualquer de um café qualquer, em uma cidade qualquer. Sobre a mesa um copo (meio cheio ou meio vazio?) de frappuccino, um livro sobre a obra de Tarantino e minha câmera fotográfica.
Olhei para o lado e vi um rapaz se sentando em outra mesa qualquer. Sentou-se. Aproximou sua cadeira da mesa. Folheou o cardápio rapidamente chamando o garçom em seguida com um aceno. Tirou o celular do bolso do jeans, digitou algo e largou-o sobre a mesa. Ajeitou-se na cadeira. Arrumou os cabelos loiros e me olhou. O mais belo par de olhos azuis que os meus olhos escuros já tiveram a felicidade de encontrar nos acasos da vida.
Ele notou que eu o estava observando. Sorriu e eu corei. Com a timidez resolvi voltar a minha atenção novamente para a minha bebida e meu livro. Um parágrafo. Olho por cima do livro: ele observa a rua. Seu perfil é lindo. Outro parágrafo. Ele está olhando pra mim. Volto para o livro e leio mais duas ou três linhas. Minha curiosidade me vence e eu me pego observando-o novamente e noto que ele está sorrindo para mim. Corro meus olhos de volta para meu livro.
Onde eu estava mesmo?
- Olá, você se importaria se eu me sentasse com você? Vi que você está lendo sobre Tarantino e... Uma garota que gosta de Quentin Tarantino não pode ser chata. – Ele diria parado bem na minha frente com um sorriso bobo nos lábios bem desenhados.
Eu negaria com um sorriso e assim ele puxaria a cadeira para se sentar, pegaria o livro das minhas mãos para uma folheada e então conversaríamos sobre o estilo do diretor. Sobre a escolha das trilhas sonoras, a fotografia dos filmes e a violência. Eu terminaria meu frappuccino enquanto ele toma seu chá gelado com limão. Conversamos sobre cinema e sobre música. Sobre nossas infâncias e como ele odeia que o chamem de Tony pois acredita que é apenas um apelido muito infantil para Anthony.
Diria também que tem 23 anos de idade e se formou a pouco tempo em História e adora ler qualquer coisa sobre a Segunda Guerra Mundial. Que nasceu em Orlando e mudou-se com os pais para Nova Jersey aos 6 anos de idade e aos 10 foi para uma cidadezinha pequena em Ohio onde ficou até ser admitido na Brown.  Diria que é um grande fã dos Beatles, com uma forte ênfase no George Harrison, e então entraríamos em uma longa discussão sem vencedores já que prefiro os Stones. Ele elogiaria meu vestido vermelho, e eu sua camisa xadrez.
Antes de nos despedirmos trocaríamos telefones e combinaríamos um encontro em um restaurante vegetariano bem renomado, mesmo dia em que teríamos nosso primeiro beijo. De despedida. Doce e intenso. Teríamos nossa primeira noite juntos depois do quinto encontro, é minha regra, mais ou menos na mesma época em que ele me pediria em namoro.
Namoraríamos por mais de dois anos aos trancos e barrancos. Ele conheceria meus pais e minha avó, e nós viajaríamos para Orlando para que eu conhecesse toda a sua família durante um feriado de Ação de Graças. Alguns dias após a nossa volta ele me pediria em casamento em uma tarde de Domingo naquele mesmo “café qualquer” em que havíamos nos conhecido. Mesmo soando bastante cafona viveríamos felizes, não para sempre, pelo restante de nossos anos juntos. 
Levantei meus olhos da página e observei o rapaz loiro novamente. Não tomava chá gelado com limão e sim um suco, de abacaxi provavelmente pela cor. Enquanto ainda o olhava, uma moça igualmente loira e bonita vestindo uma calça jeans justa, camisa de um tecido branco e fluído e sapatos de salto se aproximava sorrindo da mesa em que ele se encontrava. A loira o cutucou no ombro. Ele se levantou sorrindo (ah aquele sorriso) e a abraçou rapidamente antes de deixar uma certa quantia de dinheiro sobre a mesa e sinalizar para avisar o garçom.
Assim Anthony se foi.
Talvez se chamasse Edward, Luke, Sean, Robert, Julian ou Paul.
Poderia ser fã de Oasis, Prince, The Smiths ou Green Day.
E se tivesse 22 anos, talvez até 25?
Quem sabe ele estudara engenharia mecânica, letras, matemática ou até direito. Talvez não tivesse nem mesmo feito faculdade. Para mim ao mesmo tempo ele era “Anthony: fã de Beatles, 23 anos, formado em História” e ao mesmo tempo não era ninguém. Anthony (ou Tyler, Hunter, James...) é apenas um belo estranho. Uma pessoa qualquer em uma mesa qualquer de um café qualquer em uma cidade qualquer. Apenas um estranho. Uma pessoa que sem fazer alarde passou de figurante a personagem principal no pequeno filme da minha vida que se passa na minha mente e então voltou ao papel de figurante.
Anthony (mas porque diabos pensei no nome Anthony? ) talvez tivesse 23 anos, talvez fosse fã do quarteto de Liverpool, talvez fosse formado. Certezas eu tinha poucas:

1-      Eu nunca mais o veria na vida.
2-      Ele era extremamente atraente.
3-      Nós nunca teríamos um encontro em um restaurante vegetariano, nem namoraríamos e muito menos casaríamos.
4-      Minha vida continuaria a mesma depois desse dia.
E assim também aconteceria com ele. Para ele eu seria apenas uma garota de vestido vermelho lendo sobre Tarantino que insistia em ficar observando-o por cima do livro. Nada demais. Nada de importante. Assim tive uma última certeza:

5-      Eu ainda veria muitos outros “Anthonys” na minha vida.
  
Outros rapazes lindos que irão passar na minha vida sem nunca mudar muita coisa nela; apenas uma pequena paixão platônica momentânea. E do mesmo modo ele ainda veria muitas “eus”; outras garotas tímidas demais para fazer com que o Anthony a quem observam passe de uma simples paixão platônica.

A vida continua.

E cheia de “Anthonys”.

Por Mariana J.

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