sábado, 21 de dezembro de 2013

Ode à vodka

É sério? Isso é realmente sério?
Eu estava voltando do banheiro quando vi Laura se aproximando da nossa mesa com um cara. Porra Laura. Ela me diz que vai sair pra fumar e volta com um grandalhão amarrado naquele pescoçinho fino e branquelo dela. 
“Eu não vou ficar com ninguém hoje” ela disse enquanto andávamos todos para a mesa 5. Pelo jeito aquele cigarro rendeu mais do que cheiro de fumaça nas roupas. Eu me larguei no sofá, olhei o relógio, chequei o celular, olhei ao redor, qualquer coisa pra evitar ter que aturar aquela cena. Laura entrando na área privativa puxando o cara pela mão e sentando em seu colo como se os dois se conhecessem por anos. 
Parecia que mais ninguém a minha volta tinha notado a presença do penetra. Todos estavam ocupados demais com suas cervejas e suas conversas que só diziam respeito a eles mesmos. Eu gostava de cada um naquela quinta mesa – menos o babaca em quem Laura se enroscava- mas porra, ninguém vai mesmo perguntar o que diabos aquele babaca fazia ali? Então é assim que funciona? Você se forma na faculdade, reserva a melhor mesa do pub pra você e seus amigos comemorarem – só vocês- e do nada um cara vem com a mulher que você gosta, bebe da sua cerveja, e fica tudo por isso mesmo? Absurdo.
Pedro estava conversando animadamente sobre algum jogo que havia zerado semana passada e eu fingia que ouvia mas tudo o que eu conseguia fazer era pensar naqueles dois pecadores sentados na minha frente quase se engolindo. Porra Laura.
Pede um combo aí. vodka e energético.
Três dedos de vodka, 2 de energético. O primeiro copo desceu ardendo mas era melhor do que aguentar o casal desentupidor. Cada um com um copo na mão, vodka, energético, gelo, cerveja. A garrafa passando de mão em mão com menos líquido em cada passada.
Três dedos de vodka, 2 de energético.  O grandão afunda a cara grande dele no pescoço branco feito cal dela.
Três dedos de vodka, 2 de energético. A banda começa a tocar e eu gosto da música, antes que eu pudesse entender, Anna me faz levantar e me leva até o palco para dançar um pouco. Tropeço.
Voltamos pra nossa mesa depois de meia dúzia de músicas porque os pés de Anna doem. Três dedos de vodka, 2 de energético. Noto que Laura está sentada agora na poltrona e não no colo do babaca.  Troquei a vodka pela água.
Enquanto cantava com um dos meus braços abraçando as costas de Pedro vi Laura se levantando e o babaca voltando. Voltei para a vodka.
Três dedos de vodka, 2 de energético. Ela está sentada se lado sobre as pernas grossas dele. Seu vestido azul sobe alguns centímetros enquanto ele passa sua mãozona sobre as coxas dela e sussurra algo em seu ouvido. E ela gosta. Porra Laura.
Arrumem um quarto.
Me levanto e vou trombando nas pessoas que dançam até o banheiro masculino. Meus olhos já estão vermelhos do álcool. Junto um pouco de água gelada nas minhas mãos e acerto no meu rosto deixando cair um pouco sobre minha camiseta. Grande merda.
Começo a me sentir enjoado mas tenho plena noção de que não é culpa da segunda garrafa de vodka que roda os dez pares de mãos na mesa cinco. Laura canta animadamente enquanto o cara observa os integrantes da banda. Pelo menos os dois estão de pé. Três dedos de vodka, 2 de energético.
Solto uma risada baixa ao notar que Mr.Brightside toca nos altos falantes enquanto a banda faz seu intervalo para tomar uma água, uma cerveja ou ir ao banheiro dar uma mijada. Essa música não poderia vir em hora melhor. E eu ainda não consigo olhar os dois. It’s killing me and taking control. Ninguém parece notar então eu só canto junto.
Quatro dedos de vodka e só porque o grandão terminou com o energético.
Anna, pede uns refrigerantes aí.
Quatro dedos de vodka, 3 de refrigerante. Melina me pede um gole do meu copo e eu levo até ela. Tudo em câmera lenta.
“Caralho cara, isso tá muito forte.”
Eu nem tô sentindo mais.
Eu olho em volta e vejo todos dançando, menos o casal desentupidor. Parece que o cara está tentando tirar algum órgão dela pela boca. E eu me divirto mesmo assim. É complicado não se divertir depois de ter tomado sozinho meia garrafa de qualquer bebida alcoólica. Mas ela está chupando o pescoço dele e ele aperta a bunda dela. E ela não reclama. Porra Laura.
Meus amigos começam a ir embora. Primeiro foram Melina e Tiago. E o grandão continua alí. Ele tem cara de Rodrigo. Laura foi ao banheiro retocar o batom. Pra que retocar se já vai esfregar a boca vermelha na cara inteira do Rodrigo. Ou Carlos. Ou Matheus. Ele tem cara de Rodrigo.
“Chega de vodka, agora você vai ficar só na água velho. Não quero gente vomitando no meu carro.”
Pode deixar.
Um dedo de vodka, três de refrigerante.
Eu tô com fome Pedro.
“Eu também, a gente passa em algum lugar no caminho da tua casa.”
Pedro sim é um amigo. Laura não. Amigos não trazem um estranho pra mesa que você reservou e ficam se lambendo. Ela se levantou e veio se despedir de mim.
“A gente se vê por aí.” Ela disse me beijando o rosto. “Desculpa por ele.”  Falou me olhando com aqueles olhos negros e dissimulados. Tive vontade de beijá-la. Beijá-la melhor do que aquele babaca ou qualquer outro cara jamais faria. Tirar seu folego. Mas não. Só acenei pra ela e para o grandalhão enquanto eles saiam do pub. Grande merda.
Digamos que a noite não foi exatamente como eu tinha imaginado e eu vou vomitar até o que eu não tenho no corpo mas por alguns minutos eu consegui me esquecer dos dois. O que importa mesmo é que eu tenho amigos que me aturam mesmo estando bêbado. Todo mundo precisa de amigos assim.
Eu fiquei repetindo pra mim que eu estava pouco me fodendo para o que os dois fariam depois de sair. Laura já é grandinha o suficiente. No dia seguinte ela provavelmente ficaria falando por horas de como a noite foi maravilhosa e eu fingiria que não tive que me segurar para não dar uns bons murros naquele cara. Quebrar cada dente perfeito. Emoldurar aqueles olhos azuis com círculos roxos. Quebrar umas duas costelas e depois ir embora com ela.

O que realmente importa é que a vodka existe. 

Por Mariana J. 

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